A correção postural é frequentemente vista como uma tábua de salvação para aqueles que se veem a braços com dores recorrentes e que sentem que a forma como orientam o seu corpo no espaço está longe de ser a mais correta devido à dificuldade em manter-se com as costas direitas, desníveis de ombros, rotações do tronco, sensação de anca mais alta, etc. Com base nos trabalhos de Melzack sobre dor, nas guidelines do British Medical Journal (BMJ) de 2017 e nos conceitos difundidos por Peter Sullivan (um dos maiores especialistas em dor crónica na coluna do mundo), e da Sociedade de Estudos de Escoliose e Reabilitação Ortopédica (SOSORT), vamos mostrar-lhe quando a correção postural é realmente necessária e eficaz e em que casos está provado que o seu uso pode ser mais prejudicial do que benéfico.


Correção Postural em Crianças, Adolescentes e Jovens

Para crianças e adolescentes, a correção postural pode ser crucial, especialmente em casos de escoliose. A SOSORT oferece diretrizes claras sobre o tratamento da escoliose com base no grau do ângulo de Cobb, um dos critérios importantes para determinar a gravidade da curvatura da coluna e qual o melhor tratamento.


Escoliose e Correção Postural

A escoliose é uma curvatura tridimensional da coluna vertebral que pode afetar não só a postura, mas a saúde geral e também a auto-estima. A avaliação do ângulo de Cobb é feita através de um raio-X extralongo, essencial para determinar o tratamento adequado:

  • Ângulo de Cobb < 20 graus: Geralmente, uma escoliose leve é monitorada com observações periódicas e exercícios posturais. A correção postural nesta fase (e em todas as outras também) envolve exercícios específicos que devem ser conduzidos por profissionais com formação específica para escoliose e que sigam as diretrizes da SOSORT.
  • Ângulo de Cobb entre 20-40 graus: Escolioses moderadas podem exigir o uso de coletes ortopédicos, além de exercícios de correção postural. A combinação de exercícios específicos e o uso de colete visa impedir a progressão da curvatura.
  • Ângulo de Cobb > 40 graus: Escolioses severas podem necessitar de intervenção cirúrgica. Antes e depois da cirurgia, a correção postural através dos exercícios específicos é essencial para a reabilitação e manutenção da função da coluna.

Para crianças e adolescentes, a correção postural pode prevenir a progressão da escoliose e evitar complicações futuras. É uma intervenção importante para garantir o crescimento saudável e a funcionalidade da coluna vertebral. A escoliose em crianças e adolescentes é uma doença tendencialmente progressiva. Ou seja, a partir do momento em que é detectada, é fulcral que exista uma intervenção imediata para impedir que o ângulo da curvatura aumente e torne todo o processo de reabilitação mais difícil. Sublinhamos que é altamente desaconselhado “esperar que piore para tratar” ou tratar com algo que não sejam os exercícios específicos para o efeito, como natação. Não quer dizer que a natação não possa ser realizada: pode! Apenas não é considerada tratamento quando olhada de forma isolada. O prognóstico depende da idade, maturidade óssea, adesão ao tratamento, etc.

Correção Postural em Adultos


Para adultos, a correção postural tem um papel diferente porque nos adultos, não é através da correção das assimetrias que se consegue aliviar a dor. Esse é um conceito ligado nomeadamente à popularidade de “endireitar para tratar”, que hoje em dia está ultrapassado. Além disso, o nosso corpo não é simétrico, pelo que tentar tornar simétrico aquilo que por natureza não o é, pode ser mais prejudicial do que benéfico.

Os trabalhos de Ronald Melzack, coautor da Teoria do Controle da Porta da Dor, e as guidelines do BMJ de 2017, juntamente com os conceitos de Peter Sullivan, enfatizam uma visão mais abrangente sobre dor e postura. Esta visão, apesar de ser a que mais recolhe consenso dentro da comunidade científica, choca com as crenças da população em geral e infelizmente ainda é pouco difundida. Este é um dos motivos pelos quais os números da dor crónica de coluna não param de aumentar nas últimas décadas. No entanto, está na hora dos profissionais de saúde reeducarem os seus pacientes, oferecendo-lhes condutas terapêuticas baseadas em evidências científicas e que funcionam. Este é o caminho que temos de seguir para inverter a pandemia de dor em que nos encontramos.


Correção Postural e Dor em Adultos


A má postura é frequentemente citada como causa de dor lombar e cervical em adultos. No entanto, a relação entre postura e dor é mais complexa do que se pensava. Estudos indicam que a postura por si só não é, na maioria dos casos, a principal causadora de dor. Outros fatores, outrora (e muitas vezes ainda hoje) vistos como “menores” devem ser tidos em conta e ponto central do tratamento: falamos de stress, ansiedade, qualidade de sono, atividade física, força muscular e hábitos de vida terem um papel muito significativo na saúde da coluna vertebral.


Dor Crónica e Postura


Melzack sugeriu que a percepção da dor é modulada por vários fatores, não apenas por estímulos físicos. Isso implica que a postura, embora potencialmente importante, não é o único fator determinante da dor crónica. As diretrizes do BMJ de 2017 recomendam uma abordagem multifatorial para o tratamento da dor lombar crónica, incluindo terapia manual principalmente em fases agudas e subagudas (quando a pessoa tem dificuldade em fazer as suas atividades de vida diária), exercícios, terapia cognitivo-comportamental e mudanças de estilo de vida.

Por outro lado, a mesma guideline desincentiva a toma de medicação para alívio da dor, principalmente quando usada de forma isolada e muito menos em forma de auto-medicação. Assim, uma abordagem focada apenas num “modelo ideal” de alinhamento dos segmentos corporais e de busca de simetria é, na maioria das vezes, insuficiente para atingir os resultados pretendidos. Todos os corpos são diferentes e têm a sua própria forma e estrutura. Idealizar um esquema corporal de alinhamento dos segmentos igual para todos acabará por não servir para ninguém e será (mais uma) tentativa frustrada de alívio da dor.


Correção Postural na Prática - Sim ou não?

  • Educação Postural: Ensinar os pacientes sobre a mecânica corporal adequada pode ajudar a reduzir a dor e melhorar a postura, mas não deve ser a única estratégia.
  • Educação em Dor: Este é um conceito moderno que tem tido bons resultados para o alívio da dor. Ensinar o paciente sobre como se deve comportar se passa horas na mesma posição no trabalho, fazendo intervalos regulares, explicar os efeitos negativos da auto-massagem constante (a chamada hipervigilância), perceber o grau de cronicidade, de intensidade e de frequência da sua dor e elaborar um plano realista são alternativas viáveis, cientificamente validadas e que podem ser uma lufada de ar fresco para quem já tentou de tudo e está disposto a comprometer-se com uma nova abordagem. É todo um novo mundo que surgiu nos últimos anos e extremamente importante para o sucesso terapêutico. Tal como um diabético tem de saber que não pode entrar numa loja de doces e comer tudo que lhe aparece à frente, o portador de dor crónica tem de saber exatamente que tipos de conduta a ciência mostra que poderão ser ou não benéficas para si. A correção postural por si só e sobretudo o “forçar uma boa postura” não o é!
  • Terapias Multimodais: Combinar exercícios a longo prazo, terapia manual em casos agudos e subagudos de dor com impacto significativo nas atividades de vida diária e intervenções comportamentais quando necessário, é uma tríade que, bem doseada, pode ajudar a eliminar ou diminuir a dor crónica de coluna e é mais eficaz do que a correção postural por si só e usada de forma isolada.


Conclusão: Correção Postural, Saúde e Bem-Estar

A correção postural pode ser uma ferramenta útil, mas deve ser vista como parte de uma abordagem holística para a saúde da coluna vertebral. Para crianças e adolescentes, especialmente aqueles com escoliose, a correção postural através de exercícios específicos pode prevenir complicações (como a necessidade de cirurgia ou uso de colete ortopédico) e melhorar a qualidade de vida. Para adultos, o ênfase deve estar em um estilo de vida ativo, exercício e abordagens multimodais para a dor, dependendo da fase de dor em que o paciente se encontra (aguda, subaguda ou crónica). Um dos nossos profissionais saberá identificar em que situação se encontra e qual o melhor caminho a seguir.


Pontos-Chave:

  • Escoliose em crianças e jovens: Correção postural e tratamentos específicos baseados no grau do ângulo de Cobb são essenciais.
  • Dor em Adultos: Uma abordagem multifatorial que vai além da postura é crucial para o tratamento eficaz.
  • Educação e Exercício: Promover a educação sobre ergonomia e a importância de um estilo de vida ativo são estratégias fundamentais para a saúde da coluna.
  • Fase aguda e sub-aguda da dor com limitação da vida diária: terapia manual como, por exemplo, Osteopatia.

Para a população preocupada com a postura e a dor, a mensagem é clara: a correção postural pode ser uma parte do tratamento, mas não deve ser vista como a única solução. Incorporar atividade física regular, Osteopatia quando a dor está mais presente e limitante, e educação em dor pode proporcionar melhores resultados a curto, médio e longo prazo.

Se vive com dores nas costas ou preocupações com a postura, considere uma consulta com um dos nossos especialistas em dor para uma avaliação completa e um plano de tratamento personalizado, baseado em evidências científicas atuais que leve em conta todos os aspectos da sua saúde. Se se tratar de um adolescente e perceber assimetrias nos seus ombros e/ou ancas, o tempo pode ser um fator chave para o sucesso do seu tratamento, por isso não demore a procurar um dos nossos especialistas.



Referências bibliográficas:

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